quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Conto: Mistérios no Vale do Dulle.


No belo vale do Dulle com seus rios de águas cristalinas que percorrem toda a vasta extensão das colinas Balanares para então repousarem no tranqüilo e límpido lago Nekrat, é que por fim decidi efetuar minha formação em esquizofrenia patológica generalizada. Este ramo tão singular sempre me chamou a atenção desde os primórdios de minha vida acadêmica. No centro deste pacifico vale reside uma minúscula cidade, por certo poderia ser chamada de vilarejo não fosse pelo ótimo local estratégico para a construção do maior hospital psiquiátrico do país. O médico residente incumbido de orientar-me era nada menos que o renomado doutor Viktor Pedrios, ironicamente ou simplesmente um toque do destino, Viktor e eu havíamos cursado juntos uma especialização há alguns anos atrás. 


Viktor era um homem de grande introspecção e dono de um caráter inusitado, além disso, era inclinado a certas excentricidades relacionadas a estudos bem característicos e não fora por coincidência que nos tornamos grandes amigos. Posso lembrar-me perfeitamente daquela fatídica noite gélida de julho na qual eu e meu companheiro nos deparamos com o maior paradigma cientifico de nossas vidas. Viktor sempre ousara a estudar certas partes obscuras da metafísica e inclusive em um determinado período de sua vida pode testemunhar as mórbidas sentenças gravadas no terrível manuscrito Batorianoh de Abraxas escrito a muitos e muitos anos e com sua autoria ainda hoje desconhecida. Além deste manuscrito nefasto, meu amigo possuía uma coleção de tomos antigos escritos por grandes sábios do passado inclusive os papiros perdidos de Seleferios conhecido como o maior estudioso do sobrenatural das eras gregas. Contudo mesmo com tal repertorio fantasmagórico, Viktor assim como eu, não pode conceber os horrores que presenciamos na noite de 13 de julho de 19.. a qual acredito eu, tenha o levado a adquirir estes comportamentos patológicos que o perturbam hoje.

Efetuávamos nosso plantão corriqueiro realizando algumas visitas a certos pacientes conhecidos por mim e pelo doutor Viktor quando um enfermeiro de nome John nos abordou. Ao que tudo indicava, um paciente acabara de chegar em um surto psicótico de proporções titânicas. Relatou o enfermeiro que para segurarem o insano necessitaram de seis dos melhores homens que dispunham. Conseguiram tranqüilizá-lo somente a base de fármacos excessivamente fortes. Repousava agora na sala 400 do bloco J e fazia-se necessário a presença de um medico uma vez que o paciente ainda apresentava espasmos esquizofrênicos.

Viktor recomendou ao enfermeiro que não se angustia-se e que iria atender o paciente imediatamente. Durante todo o percurso Viktor mostrou-se preocupado, contudo um certo ar de satisfação era percebido em sua face rígida. Acompanhe-i meu amigo e orientador pelos corredores até que por fim nos deparamos com a esperada porta, J-400 lia-se na tabuleta. Viktor entrou rapidamente e eu o segui com precaução, fechei a pesada porta de metal e dirigi meu olhar sobre o homem acamado. O paciente estava amarrado com cordas grossas de cânhamo pelos braços e pernas por poderosos nós. O sujeito possuía um corpo delgado e magricela o que indicava que a qualquer momento as cordas o partiriam ao meio, eu não conseguia acreditar que seis homens tiveram que lhe segurar. Viktor caminhou ate a maca e apanhou o prontuário sob a mesma, após uma checada minuciosa fez um sinal positivo com a cabeça. Avancei alguns passos para checar a face do paciente adormecido quando um estrondoso trovão ribombou pela janela da saleta. Meu coração disparou e levei certo tempo para acalmar-me. Os olhos do paciente continuavam abertos mirando infinitamente o teto rochoso, contudo suas orbitas oculares haviam virado em direção a nuca, sintoma comum em espasmos epiléticos. O nariz do individuo jazia quebrado, fratura possivelmente originada pela recepção calorosa dos enfermeiros. Disse-me o doutor que o prontuário informava que o sujeito provinha das regiões rurais que circundam a cidade. O socorro fora acionado por um vizinho que relatara ter ouvido gritos macabros vindos da casa do paciente.

 Uma vez chegado a ambulância os dois enfermeiros que o abordaram encontraram no em uma cena diabólica. O homem jazia nu no chão coberto por sangue, ao seu lado estavam mutilados em vários pedaços os corpos da mãe e do pai do mesmo. O lunático gritava freneticamente, MALDITO O QUE ME FIZE-SE. Repetidamente ele recitava estas palavras sem cessar. Quando percebeu a intromissão dos funcionários do hospital os atacou o que culminou em todo o desfecho que o trouxera para cá. O nome do enraivecido homem era Travis R.S. e nunca havia sido internado em hospital algum e nem mesmo havia cometido algum crime para que explica-se esse comportamento selvagem. Tudo isso Viktor me disse sem nunca tirar os olhos do paciente.

Viktor o examinou com o estetoscópio e em seguida checou sua respiração, após mais alguns exames de praxe sentou-se na cadeira próximo a cabeceira da maca e esfregou os olhos sob o óculos. Durante este período silencioso senti-me deslocado e pensei diversas vezes que não deveria estar ali. Esperamos cerca de duas horas sem que nada acontece-se quando por volta das 23 horas um murmúrio se fez ouvido. E O SANGUE DERRAMADO VOLTA AO BODE, sussurrava o homem semi adormecido. Viktor olhou-me de forma sinistra e novamente me apavorei, contudo contive meus nervos e lhe indiquei uma idéia. Sugeri que poderia induzir um processo hipnótico com o paciente e através do método catártico extrair-lhe alguma informação relevante. Viktor ponderou alguns instantes e por fim consentiu. Posicionei-me próximo a cabaceira da cama e semi-serrei os olhos de Travis. Então comecei o processo hipnótico habitual regrando o conteúdo sub consciente de meu paciente para que se submete-se a minha vontade. Tentei cerca de 30 minutos esse processo quando por fim a mente dopada do homem cedeu. Perguntei se me ouvia e a resposta surgiu mecanicamente como um sim efetuado por um aceno de cabeça. Disse ao doutor que agora ele estava a sua mercê. Viktor levantou e apoiou as mãos sobre a maca e indagou ao homem. “Quem és tu que habitas este corpo? De onde vens o força de eras passada?” Dessa maneira o corpo do homem sobressaltou-se por inteiro e como se reuni-se do fundo do universo cósmico forcas para responder escancarou a bocarra e uma voz mais terrível que a morte se fez ouvida por todo o corredor norte do bloco J.

“TUPÃÃÃÃÃ, O FEIXE DE FOGO SE APAGOU E O EGITO NÃO MAIS GOVERNA O LESTE, ERGUE-TE NEMOFETE PARA CAIR SOBRE MEUS PÉS. TU MORTAL QUE ME ACORDAS, SOU O TEU ALGOZ E O ALGOZ DE TEU AMIGO. NÃO RECORDAM VÓS QUANDO CORRIAM EM VOLTA DO AMAZONAS E ME OFERECIAM MANJARES? OU QUANDO SERVIRAM NAS CRUZADAS COMO FORÇAS IRMÃS? OU QUANDO PERSEGUIAM OS COMETAS E DE MIM FUGIAM AINDA EM FORMAS LUZENTES. POIS SOU O PERSEGUIDOR ETERNO NÃO IMPORTANDO A FORMA.”

Tudo que ocorreu após isto não recordo com precisão, de dentro da bocarra do homem inconsciente surgiu uma força espectral que não é possível descrever, mas que brilhava com todas as cores em um intensidade estrondosa. Assim como um turbilhão ela ribombou e penetrou o peito de meu amigo, em seguida tudo escureceu e feneceu.

Acordei sobre uma maca na área sul algumas horas depois, os médicos informaram que eu havia sido atingindo durante um surto do doutor Viktor. Ao que tudo indica, após anos tratando de pacientes esquizofrênicos o pobre doutor acabou cedendo a loucura. Os médicos o trancaram nas regiões mais profundas do sanatório alegando que Viktor não dizia coisa com coisa e que se tornara agressivo. Discordo destes ilustres senhores, pois eu sei o que aconteceu naquela noite e não é algo fácil de aceitar. Sei que muitos não acreditarão em tudo em que aqui relato e também sei que posso parecer perturbado mentalmente. Mas principalmente eu sei o que habita o corpo do bom e velho doutor, trancado no subsolo do sanatório da pequena cidade do vale do Dulle onde as aves sobrevoam o belíssimo lago Nekrat calmo, tranqüilo e sereno.

@alan_myla

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